Conheça as fases de um relacionamento abusivo, com a psicóloga Bruna Nicoletta.
De acordo com a ONU, Estados devem combater violência doméstica na quarentena por COVID-19. Embora existam inovações em pedidos de ajuda (os boletins de ocorrência em casos de violência doméstica podem ser feitos online, pode-se usar o aplicativo Direitos Humanos BR ou até clicar em um botão de denúncia através do Magazine Luiza), muitos dos lugares que serviam como rede de apoio têm tido redução de horário de funcionamento ou foram interrompidos (igrejas/centros, serviços de proteção social, casa de amigos e familiares).
Junto a este cenário, a multifunção – normalmente – das mulheres acrescentado às incertezas futuras, estresse do confinamento e aumento do uso de substâncias psicoativas levam a uma maior vulnerabilidade e dificuldade de rompimento das relações abusivas.
Como psicóloga, entendo que precisamos nos debruçar na temática do relacionamento abusivo para despertar um questionamento e reflexão no (a) leitor (a), uma vez que, só há quebra de padrão se houver conscientização. Dentre alguns fatores, citarei o que entendo como principal para caracterizar um relacionamento abusivo.
Ciclo da violência e suas fases
Fase 1 – Tensão: quando um dos lados mostra irritabilidade, tem acessos de raiva, mesmo que com questões do cotidiano, podendo ameaçar ou humilhar. A pessoa que está do outro lado tende a ficar aflita, esconde alguns comportamentos do parceiro para que amigos e familiares não o julguem. Costuma negar, mas procura evitar qualquer conflito. Pode ser uma fase duradoura.
Fase 2 – Ato de violência: explosão do (a) agressor (a). Toda a tensão da fase 1 se materializa em violência, seja ela verbal, psicológica, patrimonial, moral ou física. A vítima costuma ficar paralisada, sente-se envergonhada, com medo, raiva e solidão. Nesse momento, há um distanciamento do (a) agressor (a), bem como algum pedido de ajuda para amigos ou familiares, às vezes instituições.
Fase 3 – Lua de mel: há arrependimento do (a) agressor (a), que busca a reconciliação, enquanto a vítima fica confusa, pode sentir-se pressionada socialmente, principalmente se tiver dependentes. Por um período há a calmaria, esforços para mudanças de atitudes, remorso, estreitando a codependência do relacionamento. Em algum momento a tensão volta e retoma-se à fase 1.

Ao entendermos essa dinâmica de relacionamento, podemos abrir outras reflexões: amores são ambivalentes, por vezes temos sentimentos “negativos” pelo outro ser diferente de nós e é preciso levar isso em consideração. É a multiplicidade de sentimentos que permite a alteridade (compreensão de que o outro é diferente de mim) e a partir dela que estamos livres para não corresponder a tudo que o outro deseja. Mas e quando estamos tão distante de nós que nem conseguimos ouvir os nossos desejos? E se antes de nos relacionarmos amorosamente esta dinâmica já acontecesse em nossas vidas com nossos pais/responsáveis, amigos?
É muito frequente que relacionamentos abusivos se reproduzam de forma transgeracional e que acreditemos que aquela maneira de se envolver seja a mais comum. O rompimento desse ciclo só é viável quando há este tipo de questionamento, pois indica que a pessoa está se abrindo para outras possibilidades em sua vida, sem se determinar por aquilo que já aconteceu.
No que diz respeito ao Estado, há a necessidade de pensar em políticas restaurativas para a população que há décadas sofre por isso.
Atualmente, quando uma mulher em situação de risco recorre ao Estado, ela é colocada em um abrigo para a sua proteção e lá recebe incentivos para refazer a sua vida. Uma iniciativa paliativa e apaziguadora. Cabe ao Estado agilizar as denúncias, bem como ter medidas de orientação para que agressores reconheçam o machismo que lhes acomete e também os violenta, reforçar campanhas publicitárias que permitam que as vítimas se identifiquem e busquem auxílio, além de treinar profissionais para que saibam conduzir os casos sem reproduzir a violência em alguma instância.
O processo de transformação desta realidade é lento, doloroso, individual, mas também político, que tem eclodido cada dia mais pedindo a nossa atenção.
Você pode agendar uma consulta on-line com a psicóloga Bruna Nicoletta via Whatsapp. Também pode conhecer mais conteúdos relacionados ao contexto da quarentena aqui no blog!
Texto escrito por: Bruna Nicoletta
Editado por: Maria Beatriz Santos